segunda-feira, 25 de março de 2013

RESGATANDO A ESSÊNCIA DO EVANGELHO

Por Pr. Guedes Maia

RESGATANDO A ESSÊNCIA DO EVANGELHO

O Evangelho é boas novas ou notícias alvissareiras. O arauto era um representante do rei enviado às províncias para anunciar ao povo as boas novas do reino. O profeta João Batista foi o arauto do Reino de Deus, anunciando uma nova visão e uma nova ética. A mensagem do reino em sua versão mais completa seria entregue pelo próprio rei, que ora vinha também na qualidade de profeta: Jesus de Nazaré. Vemos essa ética até mesmo na ocasião de seu batismo quando João alegou que precisava ser batizado por Ele, todavia, depois de insistir, cedeu aos argumentos do batizando: “Deixa por agora, porque assim nos convém cumprir toda a justiça”. 


Não é de hoje que a igreja vem sofrendo com as investidas contra a ética e a justiça dentro de seus termos. Isso não só repercute negativamente dentro e fora do cristianismo autêntico como enfraquece as bases das virtudes encontradas na religiosidade chamada evangélica. No decorrer dos anos, a igreja tem sido vítima dos piores ataques contra o evangelho autêntico. Sem recorrermos aos já conhecidos movimentos heréticos históricos, como ebionismo, arianismo, docetismo, gnosticismo,  apolinarianismo, montanismo, entre outros, embora cada um desses movimentos tenha sua importância e contribuição para a apologética, queremos fazer menção aos tempos hodiernos e aos novos paradigmas que solapam o combalido cristianismo atual. 


Uma grande revista cristã em nosso país¹ trouxe uma matéria intrigante sobre a perda da essência do evangelho na Europa e aborda a crise evangélica cristã nos seguintes termos: “O caminho da fé traçado pelos cristãos durante séculos parece abandonado”.  Ao apresentarem a necessidade de uma re-evangelização no velho continente, os editores daquela matéria definiram a tarefa como “colocar as pessoas outra vez na órbita de Cristo”. Contudo, não é tarefa das mais fáceis, posto que o evangelho para quem perdeu a essência não é novo, nem bom. “Não é novo porque o cristianismo já foi experimentado” e “não é bom porque o cristianismo se tornou desnecessário”. Assim, o cristianismo foi comparado a uma mulher divorciada, que enquanto solteira “tinha esperanças, sonhos ideais e aspirações”, porém, divorciada, “sofre de frustrações, lembranças amargas, experiências desagradáveis e apatia” espiritual.


O cristianismo brasileiro caminha a passos largos para o divórcio com Cristo. Já dizia alguém que a apostasia começa no joelho. Somos uma geração que não ora, que não lê as escrituras e que não faz nenhuma reflexão séria e profunda sobre a ética e a essência do evangelho. Os apologistas, defensores da fé e da doutrina cristã, são discriminados e tidos como fanáticos desnecessários e personae non gratae ao mais novo estilo de vida gospel. Embora concordemos com Karl Barth, que dizia que a defesa do evangelho é o próprio evangelho, vemos uma necessidade de resgatar sua essência, posto que o mesmo só possa exercer sua própria defesa onde se prega ou ensina a verdadeira boa nova.


O tempo e o espaço trouxeram consequências e mudanças na visão comprometida do reino.  Visando abrir os olhos dos leitores, apresentamos algumas visões que caracterizam o movimento gospel e expomos nossa humilde colaboração para renovo da fé e prática no seio cristão. 


Visão Antropomórfica


Trazer as pessoas de volta à órbita de Cristo é o árduo desafio da igreja brasileira hodierna, mesmo porque vivemos um cristianismo sem sal, onde o que prevalece é a cultura show-gospel, onde prevalecem as luzes coloridas que tentam ofuscar o brilho de Cristo em nossos cultos e liturgias. O homem deseja ser como Deus desde os primórdios, as criaturas rebeladas aspiram tomar o lugar do criador mesmo antes que houvesse existência humana na terra e criam para si mesmos palcos e acendem os holofotes para centralizarem a criatura: o homem, seu instrumento de glória. Pregadores e suas mensagens já não glorificam a Cristo e, de longa data, esqueceram a base cristocêntrica em suas pregações, detendo-se a conceitos puramente humanos e, por vezes diabólicos, destronam Cristo e entronizam seus próprios egos inflados de vanglória. Cantores, tidos como sacros, abandonaram, em seus louvores o eixo da cristologia básica e interpretam canções ocas, vazias de conteúdos e significados bíblicos ou doutrinários. Líderes de ministérios aparecem em fotos exclusivas nas portas de suas denominações e exploram ao máximo suas imagens, levando o povo a associar sua fé ao líder-fundador  (Jo. 6.66-69).


Visão Mercantilista


Nosso cristianismo é como aquela mulher divorciada que perdeu os sonhos e aspirações do primeiro amor e agora, com as experiências desagradáveis do mercantilismo, se vê frustrada e apática espiritualmente. O mercantilismo nas igrejas imergiu uma multidão a um plano secundário de fé, oferecendo prosperidade material e sucesso em curto prazo, os mercantilistas cristãos induzem inúmeros consumidores de seus produtos a uma condição inferior de crença, dissociada de Cristo, e a um plano secundário, adoecendo os que aderem e minando as bases da verdadeira doutrina. Com promessas delirantes de vida melhor no contexto desse mundo, que é lugar de aflição, juram e oferecem conforto e bem estar. Assim, os novos cristãos se apegam aos bem materiais como a coisas mais essenciais e necessárias à sua condição de existência. Associada ao espirito consumista de nosso século, a visão dos mercadores religiosos, convence os crentes a comprarem seus produtos e mensagens, transtornando assim o evangelho e frustrando milhões de consumidores com suas falácias, distorcendo as escrituras (Gl. 1.6-9) e afastando-os do genuíno, puro e simples evangelho de Jesus Cristo. O evangelho virou negócio e domínio de poucos (II Pd.2.3) .


Visão Imperialista

O mais novo empreendimento e “conquista” dos novos visionários evangélicos, que estão ascendendo, ao poder é a expansão de seus próprios reinos ou negócios, muito mais que o Reino de Deus. Pasmem os leitores, mas os novos mandatários do poder gospel descobriram uma fórmula ou uma forma de evangelizar inédita e inaudita: comprar igrejas com porteiras fechadas. Aliás, nada é tão novo assim, pois essa prática, já de longa data, é muito comum entre empresários do agronegócio, fazendeiros e latifundiários. Comprar uma igreja com porteira fechada significa comprá-la com tudo o que tem dentro: prédios, cadeiras, aparelhagem de som e, claro, os crentes, com sua capacidade de receita (leiam-se dízimos e ofertas).  Desse modo, alegando fazer missões, justificam o “crescimento” de seus ministérios e podem pedir mais dinheiro aos investidores, patrocinadores ou parceiros para ampliação e expansão de sua visão única, concedida por Deus somente a eles. Movidos por uma espiritualidade jamais vista, tais homens alegam ser pessoas especiais, chamadas por Deus para promoverem uma revolução e utilizam-se do evangelho para aliciar adeptos incautos com seus discursos atrativos. Quem não se lembra de uma letra poética e crítica de denúncia social que varreu o Brasil no final dos anos 70: “Êh, vida de gado, povo marcado, êh, povo feliz”. Assim, o povo de Deus tem sido tratado como massa de manobra e defesa de direitos imperialistas religiosos (I Pd. 5.2,3).

Pelo Resgate do Evangelho

Urge a necessidade de mudança, ou melhor, de um retorno ao verdadeiro cristianismo. Faz-se necessário uma reforma para além da Reforma Protestante, uma vez que necessitamos de uma reforma eclesiológica que venha atender as aspirações do coração de Deus nas escrituras e restabelecer as bases da verdadeira doutrina cristã, desprezada pelos cristãos brasileiros, onde Cristo seja o centro de nossas vidas, cultos e liturgia. Assim como os europeus e em outras nações espalhadas pelo mundo, corremos o risco de vivermos frustrados, posto que, divorciados da essência, seríamos apáticos espiritualmente e adoecidos na práxis cristã.  Os líderes do chamado movimento neopentecostal, a teologia da prosperidade, a confissão positiva e a visão deturpada do G12, entre outros, são os culpados diretos e têm contribuído para o desvio doutrinário e litúrgico em nossas igrejas.  Há necessidade de um choque pelo evangelho genuíno, pela pregação cristocêntrica, pela hinódia inspirada nas páginas da Bíblia, pela ética cristã; de uma ruptura com conceitos equivocados e práticas inadequadas da fé pela fé, por exemplo, e um retorno imediato à pureza e simplicidade que há na Pessoa de Cristo e em Suas palavras e Ensinamentos.
 
Que Deus tenha misericórdia da igreja no Brasil e levante vozes como a de João Batista com uma nova proposta de Reino, que na realidade é a mesma que sempre esteve no coração do Pai e faça nascerem precussores de uma nova reforma nos quatro cantos de nosso país, visando a volta aos princípios da Palavra. Envie obreiros comprometidos com a Verdade e estabeleça pregadores que preguem a Cruz. Que nosso hinário se debruce sobre a cristologia e que os líderes abandonem a prática mercantilista e imperialista a fim de vivermos o verdadeiro evangelho de Jesus Cristo: “Poder de Deus para salvação de todo aquele que crê” (Rm. 1.16).
¹ http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/337/a-europa-se-perdeu-e-precisa-de-jesus

Maranata. Ora Vem Senhor Jesus!
Deus abençoe a todos.